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Quando o dinheiro deixa de ser moeda e se torna mercadoria

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A movimentação de ativos entre uma nação e outra é natural no contexto da interação dos sujeitos, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas. As razões podem surgir de vários motivos. Operações comerciais internacionais, investimentos, movimentação de dividendos de empresas, férias, busca por proteção contra incertezas jurídicas em determinado cenário e até mesmo benefícios fiscais oferecidos por outros Estados. Todas essas situações expõem um tráfico de dinheiro que pode gerar conflitos administrativos e até criminais em caso de disputas com o Banco Central da República Argentina e a própria Alfândega.

O Estado e seu poder de controle

É importante identificar os órgãos estatais envolvidos no controle do tráfico internacional, tanto de pessoas, bens e dinheiro em si, e até que ponto sua autoridade se estende em cada caso.

Então, os controles de imigração a entrada e saída de pessoas; O Banco Central faz o mesmo em relação moedas; e o A alfândega mantém autoridade sobre a entrada e saída de mercadorias.

À primeira vista parece fácil perceber as diferenças que existem, mas pode haver disputas entre o Banco Central e a Alfândega em relação ao dinheiro.

Dinheiro

Dado que a Alfândega controla o tráfego internacional de mercadorias, ela terá poder sobre o dinheiro? Para isso, será necessário analisar se ela atende ao caráter de mercadoria nos termos do artigo 10 do Código Aduaneiro. (1) e de acordo com isso pode ser possível importar ou exportar.

Por maioria, a Quarta Câmara do Tribunal Federal de Cassação Criminal considerou que “As notas de curso legal nacionais ou estrangeiras (neste caso, dólares americanos) são um objeto que pode ser importado ou exportado.“condenando que”Consequentemente, é uma mercadoria nos termos do artigo 10.º do CA.” (2)

Não obstante isso, há uma divisão doutrinária na consideração do dinheiro como uma mercadoria. Do nosso ponto de vista, considerando que se trata de um objeto que pode sair ou entrar no território nacional, e a alfândega tem o poder de controlar o tráfego internacional de mercadorias. (3) Ainda que o Banco Central tenha funções no controle das trocas e consequentemente da movimentação internacional de moeda estrangeira, certamente se o dinheiro entrar ou sair do território sob algum regime aduaneiro, que o habilite, a alfândega não só poderá exercer o devido controle sobre essas mercadorias, mas se houver situação irregular, poderá ser denunciada nos termos da Lei 22.415 - Código Aduaneiro - Consequentemente, o dinheiro será considerado mercadoria, passível de importação ou exportação dependendo da forma de sua extração ou rendimento. . Não é o caso quando isso é feito por meio do sistema de transferência bancária, onde o dinheiro será afetado pelo tratamento de controle do Banco Central e seu arcabouço regulatório específico..

Violação ou contrabando

Atualmente, há uma proibição de retirada de 10.000 dólares (ou moeda equivalente) o mais (4). Portanto, a única possibilidade de retirada desses valores do território será por meio de transferência bancária, que ficará a cargo do Banco Central. Esta restrição aplica-se apenas à saída e não à entrada, independentemente da exigência da declaração correspondente que deve ser efetuada.

Agora, caso uma pessoa queira sair com uma quantia maior do que o permitido, dada essa limitação, a alfândega tem poder de controle? E se for o caso, que consequências gera a eventual irregularidade que isso produz?

A saída de uma pessoa do território nacional configurará a condição de viagem que poderá ser realizada por motivos diversos e os bens transportados estarão sujeitos ao tratamento do regime de bagagem ou carga. (5). De acordo com isso, se você tiver dinheiro em sua posse que exceda o valor permitido, isso seria uma violação de tais regimes. (6) mas também poderia externalizar o crime do artigo 863 do Código Aduaneiro - contrabando -

Em nossa opinião, a violação do regime de bagagens e cargas é uma norma penal em branco típica, que deve ser integrada ou complementada com outras. Esclarecido isto, podemos constatar que haveria infração nos termos do Código Aduaneiro, quando a alfândega presumisse que a mercadoria que entra ou sai tem finalidade comercial, bem como no caso de se tentar entrar com mercadorias não admitidas pelo regime.

Portanto, se a retirada de um valor igual ou superior a 10.000 dólares estiver sujeita a uma proibição, o viajante ou tripulante estará violando o regime de bagagem ou bagagem ao tentar retirar um objeto que se revele proibido por aquele meio de retirada. No entanto, essa conduta pode ser acusada de contrabando na presença de certos elementos.

Sem entrar em detalhes sobre o contrabando, é preciso ter em mente que este crime abrange qualquer ato ou omissão que envolva dolo ou fraude, desde que tenha a intenção de dificultar, impedir ou ludibriar o controle aduaneiro.

Tal definição é composta por diferentes elementos objetivos do tipo que exigem cada um uma análise muito mais profunda, mas, em suma, é preciso ter em mente que o crime de contrabando pode ser um crime de perigo, sem que seja necessário que seja realizar o engano da Alfândega. Somente o impedir controle aduaneiro. Também é necessário que este ato ou omissão ocorre com truque ou engano e fraude -fator subjetivo- e, por sua vez, que tal conduta é adequada e tem potencial para produzir uma dificuldade ou engano ao órgão de supervisão.

Para esclarecer a diferença entre o crime de contrabando ou contrabando de dinheiro, daremos um exemplo:

No primeiro caso, ao sair do país, o indivíduo é encontrado com mais de US$ 10.000 em sua pochete, Essa conduta pode ser considerada crime de contrabando?

Para que tal crime seja configurado, deve haver uma ação ou omissão que tenha o potencial de dificultar ou enganar o controle aduaneiro, por meio de trapaça e fraude. No caso aqui exposto, haveria ocultação, mas é preciso levar em conta que o dinheiro, pela sua própria natureza de valor, não costuma ser transportado à vista de todos, muito menos quantias dessa magnitude. Assim, sempre haverá um grau de ocultação, e por esse motivo, a presunção de ocultação deve ter maior profundidade de análise na determinação do tipo penal – infração ou crime.

A jurisprudência tem entendido que, para que o crime de contrabando seja cometido, o dinheiro deve ser traficado por locais inusitados e deve ser transportado em uma pochete. -como exemplo- tal crime não estaria configurado, mas sim, poderia ser a presença de uma infração.

Consequentemente, transportar a referida quantia em mala ou em local que não configure ocultação para a prática do crime de contrabando; especialmente quando não atenderia ao requisito de adequação do esquema.  

Contudo, se o mesmo indivíduo tivesse levado o dinheiro escondido dentro de algum outro objeto, como dentro de um ursinho de pelúcia ou escondido dentro de um fundo falso em uma mala, haveria uma ocultação que evidenciaria a presunção da existência de um estratagema idôneo para enganar alfândega.

Renda monetária

Atualmente, os viajantes de qualquer categoria e os tripulantes que trouxerem ao território argentino, como bagagem ou objetos, dinheiro em espécie e/ou instrumentos monetários, em moeda estrangeira ou nacional com curso legal, de valor igual ou superior ao equivalente a dez mil dólares americanos. , deve ser declarado ao serviço aduaneiro ao entrar no país. (7).

Esta obrigação decorre da Resolução Geral 2704 de 2009, que estipula no seu quinto artigo, “Verificado o descumprimento das obrigações estabelecidas nesta resolução geral, o responsável ficará sujeito às sanções e medidas cautelares previstas no Código Aduaneiro e regulamentação complementar…”.

Em relação a essa situação de entrada de dinheiro, a simples falta de declaração não necessariamente ensejaria a configuração de crime – contrabando – nos termos do Código Aduaneiro, conforme decidiu a Câmara II do Tribunal Federal Criminal de Cassação, "Não é necessário que se trate de mecanismos sofisticados de simulação e ocultação, mas a conduta deve ser suficientemente eficaz para dificultar ou impedir o controle aduaneiro. Portanto, não basta simplesmente deixar de declarar ou simplesmente mentir para configurar o crime…”(8).

Conclusão

Do exposto, podemos deduzir que o dinheiro pode ser objeto de tráfico internacional, sendo abrangido por regulamentações tanto do Banco Central quanto da Receita Federal. Nesse sentido, o BCRA terá poder para controlá-lo. No entanto, em determinadas circunstâncias o dinheiro pode estar sujeito ao controlo aduaneiro, como é o caso de um sujeito em viagem, e será então a alfândega que deverá exercer o controlo, derivando as possíveis infrações ou situações criminais que possam corresponder nos termos do Código Aduaneiro. Nestes casos, as mercadorias são consideradas passíveis de importação ou exportação, mesmo a parte do dinheiro que se tenta importar ou exportar em violação à utilização desses regimes aduaneiros.

Felipe Coronel de la Torre é advogado. Membro do Escritório de Advocacia Guifecor – Advogados


  1. Artigo 10 do Código Aduaneiro “Para efeitos do presente código, entende-se por mercadoria qualquer objecto susceptível de ser importado ou exportado…”
  2. Tribunal Federal de Apelações – Câmara IV –“contrabando de exportação de moeda” contra Miguel Angel Ikei –
  3. Artigo 112.º do Código Aduaneiro “O serviço aduaneiro exerce o controlo sobre as pessoas e as mercadorias, incluindo as mercadorias que constituam meios de transporte, na medida em que estejam relacionadas com o tráfego internacional de mercadorias”
  4. Limite de saque em dinheiro: AFIP nº 2705/09 – Artigo 1º — A retirada de dinheiro em espécie e cheques de viagem em moeda estrangeira e moedas de metais preciosos do território argentino, por meio dos regimes de bagagem e pequenos objetos, somente poderá ser realizada quando seu valor for inferior a DEZ MIL DÓLARES AMERICANOS (U$S. 10.000) ou seu equivalente em outras moedas.
  5. Artigo 488 do Código Aduaneiro – Regime de Bagagem – Artigo 517 do Código Aduaneiro – Regime de Pacotilla.
  6. Artigo 977/978 do Código Aduaneiro – Violação dos regimes de bagagem, encomendas e franquia diplomática.
  7.  Resolução Geral da AFIP nº. 2704 – Artigo 1º
  8. Tribunal Federal de Cassação Criminal – Câmara II – processo CPE 571/2013, de 3 de agosto de 2017.

O autor é advogado, Mestre em Direito Tributário e Especialista em Direito Aduaneiro.

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