InícioDoutrinaDigitalização. Sanções e violação de direitos constitucionais

Digitalização. Sanções e violação de direitos constitucionais

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A partir da Resolução Geral nº 2573/2009 (4/12/2009) e suas alterações, ficou regulamentado que o declarante é considerado fiel depositário, devendo arquivar e guardar a documentação aduaneira, bem como fornecê-la quando solicitada pela autoridade Administração. Receita Pública Federal. 

Atualmente, diversos profissionais Auxiliares de Comércio Exterior (especificamente Despachantes Aduaneiros) têm recebido notificações de processos que estão sendo instaurados há quase uma década, com audiências agendadas para este ano de 2023. 

Não creio que alguém possa ser contra os controles adequados do Serviço Alfandegário, mas isso não é sinal verde para que tais controles saiam do controle e atropelem garantias constitucionais claras. Para melhor esclarecimento, serão analisadas diversas questões a serem levadas em consideração. 

Primeira pergunta 

A prescrição- Considerando as datas de vários desses processos (quase uma década antes do corrente ano de 2023) e suas atuais audiências, a violação da garantia de defesa consagrada no art. 18 da Constituição Nacional em consideração ao prazo razoável. Ainda mais tendo em conta o facto operacional, a posterior abertura do sumário e o desenrolar da audiência, com os quais se torna evidente o excesso de tempo decorrido, e ainda mais se não tiverem ocorrido actos que tenham significado a interrupção do processo. a prescrição.

Por esta razão, que diríamos elementar, é preciso ter em mente o prazo de prescrição da ação. Além disso, como a consequência acaba sendo uma sanção de acordo com um tipo ilegal do Código Aduaneiro (art. 994), seu tratamento não pode ser ignorado. 

Em vista disso e entrando na pertinente consideração do assunto, o Código Aduaneiro dispõe quanto à extinção das ações em matéria de infrações (arts. 929 a 946 CA) as causas pelas quais dita ação se extingue, entre as quais se destacam: encontre a receita. Ou seja, a passagem de um certo período de tempo sem que tal ação tenha sido iniciada. Nesse sentido, o art. 934 estabelece que a prescrição ocorre após o decurso de 5 (cinco) anos, acrescentando o art. 935 que o referido prazo começa a ser contado a partir de primeiro de janeiro do ano subsequente ao próprio fato ou, na sua falta, a partir do dia XNUMXº de janeiro do ano subsequente ao do fato. primeiro de janeiro do ano seguinte ao fato ocorrido, a partir do momento em que o fato ilícito for constatado. 

Em conformidade com o exposto, surge agora o problema de considerar o tempo decorrido até a abertura do resumo e o novo cálculo com base em tal decisão. Ou seja, o prazo de prescrição deve ser considerado suspenso se o resumo for aberto após decorridos 5 anos? A omissão do responsável pela promoção do processo pode prejudicar o suposto infrator? É realmente legal recomeçar a contagem do prazo depois de efetuada a interrupção, mesmo que ela tenha ocorrido depois de 5 anos? E tudo isso deve ser analisado em conjunto com a razoabilidade dos prazos dos processos criminais, como os processos por infrações aduaneiras. 

Se entendemos que as garantias são uma barreira ao poder arbitrário do Estado, não podemos deixar de considerar que a ordem pública é uma responsabilidade fundamental do Estado e, sendo o objecto da prescrição em matéria penal precisamente uma questão de ordem pública, é o Estado que tem o maior ônus no momento do seu cumprimento. Ainda mais quando a maior parte das garantias regulamentadas em nossa Constituição Nacional e em nosso sistema penal estão contidas em tratados internacionais de direitos humanos, essas garantias devem ser transferidas para o competente sistema penal local. 

O Supremo Tribunal estabeleceu na sentença Mozzati (1978) que a presunção de inocência e o devido processo legal estão integrados com uma ação rápida e eficaz nas decisões judiciais; e também o caso Mattei de 1968 em referência explícita à razoabilidade do tempo em processos criminais. Portanto, a prescrição é a garantia que permite a materialização do direito de ser julgado em prazo razoável. Compartilhando o raciocínio, entendo que a prescrição tem natureza processual, pois enseja a regulamentação de um prazo máximo razoável em que uma ação penal pode ser praticada e, além de a pretensão permanecer latente, seu exercício é dificultado pela passagem do tempo. tempo. Ou seja, como uma linha de corte até quando uma ação pode ser realizada. A questão também deve ser abordada sob a ótica do Estado, como protetor do bem jurídico tutelado e promotor do processo, na obtenção do resultado final de um processo penal em prazo razoável. 

No caso do despacho que ordena a abertura do inquérito aduaneiro, que para além das actividades do serviço aduaneiro implica a notificação ao alegado infractor para que este faça valer o seu direito, o despacho de abertura não pode ser, por si só, instrumento de interrupção da prescrição, mas deverá conter como requisito inadiável a notificação ao suposto infrator; Porque, se assim não fosse, ficaria ao critério de quem decidisse proferir a ordem de abertura do sumário sem considerar o arguido, o que, a meu ver, é manifestamente inconstitucional, pois significaria ferir o próprio fundamento da legalidade da abertura do processo. resumo aduaneiro, uma vez que o artigo 1094.º do CA prevê que o alegado infrator deve ser citado na abertura do resumo (alínea b), complementado pelo artigo 1101.º. 

Segunda pergunta

Período razoável de teste- É oportuno começar ressaltando a importância desta questão, dada a violação de um direito básico e fundamental em qualquer processo. Assim, tal consideração decorre de uma garantia elementar dos Direitos Humanos universais, acolhida, por exemplo, na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, em cujo texto se afirma: “Toda pessoa tem direito a uma audiência justa, dentro de um prazo razoável, por um tribunal competente, independente e imparcial.” (Art. 8.1) Também o art. 14 inc. O Artigo 3-c) do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos reconhece o direito de toda pessoa acusada de um crime de ser julgada sem demora injustificada. 

Ambas as declarações normativas constituem o chamado bloco de constitucionalidade, conforme disposto no artigo 75 inc. 22 da Constituição Nacional, conferindo-lhes assim a correspondente hierarquia constitucional. E é neste sentido que não há dúvidas sobre a obrigação de aplicar as disposições convencionais, nem sobre o dever de controlar a compatibilidade das normas jurídicas internas com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Tal consideração já foi apontada pela própria Corte Interamericana no caso “Almonacid Arellano e outros vs. Chile” e pela Suprema Corte de Justiça da Nação Argentina, destacando-se como precedentes as seguintes decisões: “Mazzeo” (Decisões, 330:3248) “Ekmekdjian v. Sofovich”. (The Law, 1992-C-543) e Simon (Julgamentos, 328:2056). 

A este respeito, destacam-se os seguintes precedentes de jurisprudência: CSJN, «Mattei», Fallos, 272:188. 7 SCJN, «Camilo Mozzatti», Fallos, 300:1102. SCJN, “Alderete”, Julgamentos, 324:1944. 10 SCJN, “Espósito”, Acórdãos, 324:4135. 11 SCJN, “Lépori”, Acórdãos, 324:1710. 12 SCJN, “Bartra Rojas”, Acórdãos, 305:913. 13 SCJN, “Arrastía”, Acórdãos, 326:4650 e “Barra”, Acórdãos, 327:327. 14 CIDH, Genie Lacayo vs. Nicarágua. Contexto, reparações e custos. Acórdão de 29 de janeiro de 1997. Série C n.º 30, parágrafo 77. XNUMX. 

Deve-se ter em mente também que a matéria em questão não apresenta uma complexidade tal que exija uma necessária prorrogação no tempo; e na maioria deles os profissionais concordam em pagar uma multa. Entretanto, a conduta da Entidade Reguladora demonstrou grave falta de diligência em dar uma solução adequada ao caso, sem levar em consideração o decurso do tempo sobre o direito de ser ouvido e de obter, em prazo razoável, uma decisão. Tenha em mente o precedente da CIDH, Caso Bulacio vs. Argentina. Contexto, reparações e custos. Acórdão de 18 de setembro de 2009. Série C n.º 100, parágrafos. 114 e 115 e Caso Myrna Mack Chang vs. Guatemala, Fundo, reparações e custos. Acórdão de 25 de novembro de 2003. Série C n.º 101, parágrafo. 207. E, naturalmente, é oportuno incluir os Recursos, para os quais se deve tomar como ponto de partida o primeiro ato dirigido contra o acusado (CIDH, Caso Suárez Rosero vs. Equador, op. cit., parágrafo 70).

Considerando as duas questões mencionadas, é imperativo manter e combinar ambas, pois enquanto a prescrição implica um limite para a ação penal para a aplicação de uma sanção, o prazo razoável desempenha um papel na consideração da duração correta de um processo, com o que resulta na perda do direito de ação do Estado e, portanto, na absolvição do acusado; Isto, com base constitucional e convencional. Mesmo quando um processo é prorrogado de forma inadmissível, mesmo que em tais circunstâncias o prazo de prescrição não tenha ocorrido, é apropriado declarar a extinção. 

Adicionalmente, cabe ressaltar que em termos gerais, ainda que toda a documentação administrativa/comercial deva ser conservada pelo prazo de DEZ (10) anos, nos termos do art. 328 do Código Civil e Comercial, certamente, os efeitos dessa custódia prescrevem após (5) cinco anos para permitir o exercício do controle aduaneiro. – de acordo com o prazo de prescrição para ações que a alfândega pode tomar em matéria tributária como uma infração

É nesse sentido. Que o Tribunal Tributário Nacional levou em consideração a prescrição de uma ação em razão da violação do prazo razoável. No caso em apreço, ficou estabelecido no caso “Egea”, que qualquer que seja o critério adoptado quanto à suspensão do curso da prescrição, “a duração do processo penal durante (neste caso) quase duas décadas, viola flagrantemente as garantias da o prazo razoável do processo e o direito de defesa” (Decisões: 327:4815). "Portanto, e de acordo com os critérios derivados de tais precedentes, é cabível que este Tribunal Fiscal ponha fim ao presente caso – tal como aqui se discute – declarando a extinção da ação penal por prescrição."  (cfr. Acórdão do Tribunal Tributário Nacional – Caso 23.905-A – Burello, Alejandro Adrian vs. Direção Geral de Alfândegas s/ recurso” – acórdão 10/12/2014)

Terceira pergunta

Ausência de fato gerador de infração-  O assunto está sendo tratado como uma suposta infração grave que seria um obstáculo ao controle aduaneiro adequado. Mas, na realidade, a falta de digitalização não impediu esse controle no momento certo. E pode muito bem ser considerada falta, sua formalidade se cumpre com a multa, não podendo, portanto, ensejar coexistência em outro novo processo, ainda que sob o rito de sanção disciplinar. O que é contrário à garantia non bis in idem. Por outro lado, quando a parte exerce a sua vontade de pagar nos termos indicados, a lei prevê a extinção da ação e a ausência de precedente. Demonstrando que, se os efeitos dessa extinção resultarem em que o fato não seja registrado em caráter de precedente, não só não poderá ser canalizado como registro para avaliações futuras, como também não poderá ser aplicável como dado para abertura de súmula. desta espécie. 

Nos casos de erros involuntários ou de mera inobservância, a sanção a ser imposta não poderá ser maior do que a necessária para impedir sua repetição, podendo o fato apenas ser observado, sem que isso resulte em estado de falta grave. Neste sentido, a eventual inexistência de ter sido introduzida a digitalização da pasta, não pode ser considerada falta grave, uma vez que O serviço aduaneiro ainda tem poderes de controle suficientes, mesmo sem a digitalização do documento. 

Além disso, é ainda necessário que para a correta configuração de uma infração não seja exigida apenas a configuração material do fato, mas também o elemento subjetivo dela; isto é, a participação do seu autor, pois o contrário daria origem a uma responsabilidade perigosa, meramente objetiva, que só é determinada pela consequência de um resultado. Considerando as decisões do mais alto tribunal nacional, seguindo a mesma linha no caso de infrações como para o julgamento de crimes, não seria adequado presumir antecipadamente a culpa do suposto infrator, exigindo a inversão do ônus da prova, pois se trata também de um princípio constitucional. (Erros: 311:2779; 303:1548; 297:215; (310:1822) 

Consequentemente, deve-se considerar que o fundamento da punição encontra-se nas ações do autor, ou seja, que o elemento subjetivo deve ser validamente considerado pelo juiz para chegar à determinação do grau de responsabilidade punitiva em matéria infracional com antecedência. e além da possibilidade de ser considerado para a graduação da pena nos termos do art. 915 e 916 do Código Aduaneiro. E, nesse sentido, casos como esses não devem violar direitos e garantias constitucionais, baseando-se em um interesse público que em nada foi ofendido.

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O autor é advogado. Membro do Instituto de Direito Aduaneiro e Comércio Internacional da Associação Argentina de Justiça Constitucional.

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